Belo Horizonte tinha (e ainda tem) um Carnaval de escolas de samba. Apesar da tradição, o desfile era algo tão marginalizado quanto seus integrantes periféricos — a notícia mais constante que se ouvia era sobre a briga entre carnavalescos e Prefeitura para tirar o desfile da Afonso Pena e jogar em uma estrada qualquer.

Para esse braço de ferro contra os excluídos as administrações municipais sempre estiveram preparadas. Mas não estavam, e ainda não estão, preparadas para lidar com manifestações culturais articuladas em rede.

Com o decreto de 2009 que proibia a realização de eventos de qualquer natureza na Praça da Estação, o prefeito Márcio Lacerda forneceu, às avessas, a fagulha que faltava para que os tambores ocupassem, anos mais tarde, os horizontes da cidade. A Praia da Estação, intervenção popular e irônica pautada pela ressignificação de espaços públicos, transformou manifestantes em banhistas. Os praieiros não tardaram a virar batuqueiros. O bloco estava formado.

Depois de trocar Minas por São Paulo à trabalho, eu, Ismael dos Anjos, acompanhava a Praia e suas revoluções majoritariamente à distância. Foi só em 2013, na Rua Guaicurus, que a paixão despertou. Enamorou-se do bloco “Então, Brilha” e, de lá para cá, volta paulatinamente para pular o Carnaval em Belo Horizonte. E felizmente, entre confetes e serpentinas, não é mais a cidade em que nasceu que encontra a cada ano que passa.

O belorizontino se apropriou das marchinhas, das antigas músicas do Carnaval de outros cantos, do espiritual e criou uma folia particular. Aqui, há um bloco meio Hare Krishna e meio Afoxé que leva foliões para pisar em favelas, bairros pobres e assentamentos. Aqui há um bloco que reúne negras e negros em um quilombo urbano. Aqui há um bloco que, garante, gente é pra brilhar.

A folia é e precisa ser de todo mundo. O Carnaval pode (e deve) ser de rua e de luta. A exposição “Entre o confete e a luta” é um registro de parte desse movimento festivo e horizontal.

You may also like

Back to Top